TRT14 03/03/2022 ° pagina ° 4429 ° Judiciário ° Tribunal Regional do Trabalho 14ª Região
3424/2022
Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região
Data da Disponibilização: Quinta-feira, 03 de Março de 2022
4429
Joacy, interrogado pela empresa no dia seguinte, mostrou-se
coaduna com a tipificação da CLT que envolve a ocorrência de
confuso e alegou não se lembrar do ocorrido. Mas, com a devida
ofensas verbais ou físicas, praticadas no ambiente de trabalho
vênia ao entendimento do primeiro grau, o testemunho em liça não
contra o empregador, ou um preposto / superior hierárquico, um
conduz a essa conclusão.
colega de trabalho, e até mesmo contra terceiros. Não importa, para
De plano, não se pode questionar a ocorrência do evento em si,
a configuração dessa tipificação, se a agressão for tentada ou
pelo simples fato de que o próprio autor confessou-o em seu
consumada, bem como se tenha relação com o trabalho ou não,
depoimento pessoal, em que pese tenha procurado atenuar sua
pois o que se apura é a conduta do trabalhador, o modo como este
conduta.
se porta no ambiente laboral, em razão das regras internas do
Fixada essa premissa, outro ponto que tornou-se incontroverso na
empregador, bem como, e por óbvio, as regras básicas de
instrução processual foi o autor ter exposto seus órgãos genitais,
convivência, civilidade e urbanidade no convício em sociedade.
inadvertidamente e sem consentimento dos presentes no
Não se olvida, e já foi ponderado alhures, que a rescisão contratual
alojamento, causando constrangimento e repúdio. Não é crível se
por justa causa por iniciativa do empregador é medida extrema,
considerar que essa postura seja adequada ou corriqueira pelo fato
considerada pelo Direito do Trabalho a mais grave das penalidades
de ter sido realizada no interior do quarto, ao contrário, pois tratava-
admitidas, em face dos prejuízos que tal medida provoca na vida
se de um ambiente compartilhado e haviam outros funcionários
profissional do trabalhador. Mas essa cautela não representa um
presentes. E relembre-se, conforme citado alhures, que o tipo penal
"salvo conduto" para que o trabalhador cometa atos lícitos e não
que criminaliza essa conduta não faz distinção se o ato libidinoso é
seja penalizado sob justificativa da preservação de seu emprego.
cometido em público ou num ambiente reservado, bastando apenas
Assim, reexaminando as provas, em especial a oral, não há como
que seja praticado contra outro indivíduo e sem consentimento.
chegar à mesma conclusão do magistrado sentenciante. O que se
Debater se a exposição ocorreu enquanto o outro funcionário estava
extrai do exame é que os testemunhos não socorreram a tese do
em uma videochamada, ou se o autor tocou no colega com seus
autor, ao contrário, demonstraram a má conduta, a ofensa e o
genitais, ou até mesmo se houve ou não vias de fato, além de
constrangimento cometidos contra colega de trabalho, além das
irrelevante, não elide a incontinência de conduta cometida. Não há
agressões verbais. Desse modo, o reclamante alegou não ter
falar aqui em uma suposta "percepção" sobre se foi (ou não)
cometido conduta ilícita no ambiente de trabalho que justifique o
cometida uma ofensa, quando é cristalino o cometimento de
desligamento motivado, mas a prova dos autos o contradiz.
violação comportamental, inicialmente pelo autor, e no segundo
Pela natureza da ofensa, é certo concluir que foram preenchidos os
momento, perpetrada por ambos os envolvidos, que não se furtaram
requisitos para enquadramento da conduta cometida pelo autor em
à discussão e quase chegaram a trocar agressões físicas (segundo
algumas das alíneas do art.482 da CLT, pois configurada a
relato, inclusive com um dos oponentes portando um facão). A
gravidade do ato, a ausência de perdão tácito, a imediatidade da
maior prova disso é que o desdobramento dos atos do autor, no
sanção e a isonomia, já que é incontroverso que o outro funcionário
caso, a briga que se seguiu, está bem provada pela testemunha e
envolvido também foi demitido por justa causa em razão do mesmo
foi até mesmo admitida pelo reclamante. A descrição dos fatos não
fato.
autoriza concluir que a alteração decorreu dos envolvidos terem
Ademais, comprovada a falta grave cometida pelo reclamante,
consumido bebida alcoólica antes da ocorrência, pois claramente
configurada está a quebra da fidúcia antes outorgada pelo
houve um fato gerador, cometido pelo autor; nessa dinâmica, a
empregador, elemento sem o qual torna-se impossível a
reação dos envolvidos até pode ter sido potencializada ou
manutenção do pacto laboral.
catalisada pelo estado etílico, mas não afasta tampouco atenua as
Nesse diapasão, pertinente a insurgência patronal. Dá-se
ações do autor.
provimento ao recurso patronal para, reformando a sentença,
Observe-se, nesse particular, que o fato do funcionário Joacy ter
reconhecer a justa causa aplicada, afastando a condenação da
alegado confusão e lapso de memória quando instado pela empresa
reclamada ao pagamento das verbas rescisórias atinentes à
a se explicar sobre o ocorrido, além de conveniente, era até
dispensa sem justa causa.
esperado, considerando que sabia da gravidade da situação em que
B) MULTA DO ART.477, §8º DA CLT
se envolveu e, quando confrontado, certamente temeu sofrer as
A reclamada argumenta que a multa em questão não é devida
consequências de seus atos, como ao cabo ocorreu, já que também
porque rescindiu o contrato de trabalho do autor por justa causa e
foi demitido por justa causa.
todas as verbas rescisórias foram pagas dentro do prazo legal.
Nessa linha de pensamento, a conduta imputada ao reclamante se
Além do mais, existindo verbas controversas, a multa é indevida.
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