TJSP 10/12/2009 ° pagina ° 36 ° Caderno 1 - Administrativo ° Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quinta-feira, 10 de Dezembro de 2009
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Administrativo
São Paulo, Ano III - Edição 612
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Trata-se, enfim, de questão já enfrentada e superada.
Por outro lado, quanto ao espectro de incidência da regra do art. 43, caput, da Lei nº 11.977/09, também não pode pairar
dúvida.
Bem se vê que se trata de texto inserido entre regras claramente adstritas à esfera do Projeto Minha Casa, Minha Vida,
como o são o art. 42 e o parágrafo único do próprio art. 43, conforme expressamente consignado nas respectivas redações.
Assim, em interpretação sistemática, levando em conta o posicionamento da norma no ordenamento, já se percebe que diz
respeito ao aludido Programa.
Ademais, o citado parágrafo único do art. 43, ora em foco, faz textual remissão a seu caput, ao qual se acha, por óbvio,
subordinado. E deixa claro, neste diapasão, que o caput está a tratar de custas e emolumentos “no âmbito”, precisamente, do
Programa Minha Casa, Minha Vida. Refere-se o parágrafo mencionado, com efeito, às “custas e emolumentos de que trata o
caput, no âmbito do PMCMV” (sic).
Se, na redação original da Medida Provisória nº 459/09, também da cabeça do dispositivo, que então correspondia ao art.
46 (posteriormente renumerado), constavam as mesmas palavras (“no âmbito do PMVC”), a conclusão que a boa hermenêutica
impõe é a de que foram suprimidas, meramente, para evitar redundância. A efetiva e exclusiva vinculação da isenção estabelecida
no caput do art. 43 da Lei nº 11.977/09 aos atos relativos aos contratos celebrados no âmbito do Programa Minha Casa, Minha
Vida está, deveras, livre de qualquer dúvida, mesmo porque ali figura claro e textual endereçamento da norma ao “beneficiário
com renda familiar mensal de até 3 (três) salários mínimos”. Grifamos.
Ou seja, dirige-se, inequivocamente, ao beneficiário do Programa Minha Casa, Minha Vida.
Vale lembrar que esse Programa foi instituído e disciplinado, exatamente, pela Lei nº 11.977/09, ora estudada. Sua instituição,
aliás, foi o mote e a bandeira do referido diploma legal. Tanto que sua ementa explicativa enuncia, em primeira linha, que a novel
lei “dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV”, só depois mencionando outras providências.
Mais que isso, houve o cuidado, no texto legal, de fixar os critérios de definição daqueles considerados beneficiários
para efeito da aplicação de suas disposições. Fê-lo em seu art. 3º, em que se disciplina nada menos do que “a definição dos
beneficiários do PMCMV”.
Logo, se a própria Lei nº 11.977/09 se preocupa em que sejam bem definidos os “beneficiários” do Programa Minha
Casa, Minha Vida e, no caput de seu art. 43 (na seqüência do mesmo texto legal, portanto), dirige-se, de forma expressa, a
“beneficiário”, é nítido que diz respeito, especificamente, ao beneficiário do PMCMV. Assim, o campo de incidência desta regra
se circunscreve, obviamente, ao âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida.
Eis o que se impõe concluir, como visto, inclusive por exegese gramatical, conforme dimana da terminologia adotada.
Sob o prisma teleológico, o resultado não é diferente. A própria Lei nº 11.977/09 anuncia, no que toca ao assunto examinado,
o fim em mira. Induvidoso, nesse ritmo, o conteúdo de seu art. 2º: “O PMCMV tem como finalidade criar mecanismos de
incentivo à produção e à aquisição de novas unidades habitacionais pelas famílias com renda mensal de até 10 (dez) salários
mínimos, que residam em qualquer dos Municípios brasileiros”.
Partindo-se de tal premissa, percebe-se que o indigitado art. 43 se insere inteiramente nesse contexto. Regula a situação
dos beneficiários, distinguindo-os por faixas de renda familiar: no caput, estabelece isenção de emolumentos para os casos de
renda até 3 (três) salários mínimos; no inciso II de seu parágrafo único, prevê redução de 90% se a renda for “superior a 3 (três)
e igual ou inferior a 6 (seis) salários mínimos”; no inciso I institui redução de 80% nas hipóteses de renda “superior a 6 (seis)
e até 10 (dez) salários mínimos”. Destarte, o art. 43 foi concebido, não como regra solta e aleatória, mas, sim, em atenção à
finalidade declarada do Programa Minha Casa, Minha Vida, consistente em beneficiar as famílias com renda mensal de até 10
(dez) salários mínimos. Este o universo abarcado pelo art. 43, todo ele voltado aos beneficiários do mencionado Programa, com
escalonamento por níveis de renda, mas dentro do limite máximo de valor, fixado no art. 2º. Em suma, o art. 43 é instrumento
para disciplinar a consecução de um fim, bem explicitado no art. 2º da mesma lei. Um fim que, por seu turno, é a própria razão
de ser do Programa Minha Casa, Minha Vida e na sua particular esfera deve, portanto, ser compreendido.
Tudo se acha corroborado pelos princípios norteadores da sã hermenêutica jurídica.
Tratando-se de lei especial, é natural que suas disposições não se destinem à vala comum, mas se direcionem, isto sim,
àquilo que o diploma visou particularmente disciplinar. Ou seja, in casu, o Programa Minha Casa, Minha Vida.
Inserida a norma no contexto de outras que disciplinam o mesmo Programa, cumpre adotar interpretação coerente, que faça
sentido. Vale dizer, interpretação lógica.
De ser ponderado, ainda, que por se cogitar de norma que estabelece isenção de recolhimento, deve ser objeto de exegese
estrita. Não ampliativa. Descabe, deveras, alargar despreocupadamente seu alcance, sob pena de se ultrapassar o horizonte à
vista do qual foi adrede concebida. Em casos quejandos, é cediço que se deve interpretar estritamente o privilégio. Exceptiones
sunt strictissimae interpretationis.
Por fim, cumpre reiterar que, ao eleger o vocábulo “beneficiário” para definir seu endereçamento, o caput do art. 43 da Lei
nº 11.977/09 se vincula, insofismavelmente, ao Programa Minha Casa, Minha Vida, pois é, a toda evidência, aos beneficiários
deste que o focalizado pergaminho se dirige, com a preocupação, inclusive, de defini-los, tal como estampado em seu art. 3º.
Sabido e consabido que a lei não contém palavras inúteis. Verba cum effectu, sunt accipienda.
Diante do exposto, o parecer que submetemos à elevada consideração de Vossa Excelência, mui respeitosamente, é no sentido
de que: a) seja revogada, ex officio, a r. decisão do douto Juízo da Corregedoria Permanente, para que prevaleça a Lei Federal
nº 11.977/09 ao estabelecer redução e isenção de custas e emolumentos, por inviável reconhecer sua inconstitucionalidade
nesta esfera correcional-administrativa, conforme entendimento já uniformizado no processo CG nº 2009/00097256; b) haja,
com espeque no parágrafo 2º do art. 29 da Lei Estadual nº 11.331/02, uniformização do entendimento administrativo adotado
no Estado de São Paulo, também, quanto ao alcance da isenção estabelecida no art. 43, caput, da referida Lei Federal nº
11.977/09, que se restringe aos atos concernentes a imóvel adquirido ou financiado no âmbito do Programa Minha Casa,
Minha Vida; c) sejam encaminhadas cópias deste parecer e da r. decisão que o aprovar à Secretaria da Justiça e da Defesa da
Cidadania, nos termos do parágrafo 3º do art. 29 da Lei Estadual nº 11.331/02.
Sub censura.
São Paulo, 1º de dezembro de 2009.
ÁLVARO LUIZ VALERY MIRRA
JOSÉ ANTONIO DE PAULA SANTOS NETO
JOSÉ MARCELO TOSSI SILVA
WALTER ROCHA BARONE
Juízes Auxiliares da Corregedoria
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º